segunda-feira, 5 de março de 2012

A inclusão do Homicídio como Crime Hediondo

Ao contrário do que grande parte da população imagina, o homicídio qualificado não foi considerado crime hediondo desde o início da edição da Lei nº8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), de 25 de julho de 1990.
Como é notório, na época da edição da Lei dos Crimes Hediondos, a sociedade brasileira estava assustada com a enorme quantidade de delitos considerados graves, como por exemplo a extorsão mediante sequestro e o latrocínio. De acordo com Antônio Lopes Monteiro:


Para tentar explicar essa pressa, o que não justifica de forma alguma as imprecisões contidas e os conflitos gerados, devemos entender o momento de pânico que atingia alguns setores da sociedade brasileira, sobretudo por causa da onda de sequestros no Rio de Janeiro, culminando com o do empresário Roberto Medina, irmão do Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, Rubens Medina, considerado a gota d'água para a edição da lei.
O Clima emocional para o surgimento de dispositivos duros que combatessem os chamados crimes hediondos estava assim criado. A sociedade exigia uma providência drástica para pôr fim ao ambiente de insegurança vivido no País.

Neste ponto, alguém pode perguntar, então o homicídio inicialmente não foi elencado na lista de crimes hediondos?
A resposta a esta pergunta é afirmativa, isto é, o homicídio qualificado não fez parte dos crimes considerados hediondos desde o nascedouro da referida lei.
Como é sabido, o homicídio qualificado somente passou a fazer parte do rol dos crimes hediondos a partir da edição da Lei nº 8.930 de 6 setembro de 1994.
Cumpre destacar que os pivôs para a sanção da supracitada lei que incluiu o homicídio na lista dos delitos hediondos foram os assassinatos de Daniella Perez, filha da escritora de novelas da Rede Globo, Glória Perez e da criança Miriam Brandão, morta em Minas Gerais, onde a criança foi asfixiada, esquartejada e depois queimada. Neste ponto, cumpre trazer à baila as palavras de Antônio Lopes Monteiro, in verbis:

A inclusão do homicídio entre os crimes hediondos de alguma forma vem ao encontro de algumas posições doutrinárias que não se conformavam com a sua não inclusão já na versão inicial da lei. Como questionamos acima, não se justificava a ausência do homicídio qualificado, sobretudo se praticado com certos requintes de hediondez. Atende, sobretudo, a anseios populares, já que o projeto de lei que deu origem à Lei n. 8.930, de 6 de setembro de 1994, foi incentivado por mais de um milhão de assinaturas, campanha liderada pela escritora Glória Perez, mãe da atriz Daniella Perez, assassinada de forma brutal no dia 28 de dezembro de 1992, e por Jocélia Brandão, mãe da menina Míriam, sequestrada e morta por dois rapazes em Belo Horizonte, no início de 1993.

É importante destacar que esses dois casos causaram enorme repercussão nacional e uma ânsia de punição mais severa para os autores de tais crimes (homicídio qualificado). 
A nosso ver, bastante acertada a inclusão do homicídio qualificado como delito hediondo, uma vez que os autores de tais crimes, verdadeiramente, não possuem capacidade de permanecer em sociedade, sublinhe-se, devido a sua grande periculosidade ao corpo social.
Considerando que a norma penal que incluiu o homicídio na lista dos crimes hediondos é lei prejudicial aos autores de tais crimes, uma vez que veio a trazer regras severíssimas como a previsão de ter que ser cumprido 2/3 (dois terços) da pena para se conseguir o livramento condicional (quando para os autores dos crimes que não são hediondos o cumprimento é de 1/3 (um terço) da pena), bem como a obrigatoriedade de cumprimento da pena em regime integralmente fechado (não obstante o STF ter recentemente declarado em controle difuso que tal dispositivo é inconstitucional e, logo após essa decisão, a própria LCH começou a aceitar a progressão de regime), seus efeitos não retroagirão, sendo que somente serão aplicados a fatos cometidos após sua vigência, tendo em vista o mandamento constitucional que diz que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (art.5º, XL, CF/88).
Diante o exposto, ao contrário do que pensa o credo popular, verifica-se que o homicídio qualificado somente passou a ser rotulado de crime hediondo com a edição da Lei nº 8.930, de 6 de setembro de 1994, ou seja, mais de 4 (quatro) anos após a edição da Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90).


Referência
MONTEIRO, Antonio Lopes. Crimes Hediondos: texto, comentários e aspectos polêmicos. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.