quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Reflexões criticas sobre a tradicional Teoria dos Pressupostos Processuais

No que tange ao tema dos Pressupostos Processuais, a doutrina pátria (brasileira) - esmagadoramente majoritária¹ - faz a distinção entre Pressupostos Processuais de Existência e Pressupostos Processuais de Validade.
Os pressupostos de existência do processo seriam aqueles ligados à questão da própria constituição (existência) do processo, como por exemplo a existência de Órgão investido de jurisdição, isto é, capaz de dizer o direito e aplicá-lo ao caso concreto solucionando a lide existente.
Já os pressupostos de validade da relação processual seriam aqueles umbilicalmente ligados à noção de desenvolvimento regular do processo, como por exemplo a competência ou a imparcialidade do Órgão Jurisdicional.
Contudo, não obstante a doutrina majoritária brasileira se posicionar no sentido da classificação dos pressupostos processuais entre pressupostos processuais de existência e de validade, dissentimos completamente de tal pensamento, tendo em vista o estudo que realizamos sobre a obra Teoria dos Pressupostos e dos Requisitos Processuais, do insigne mestre baiano José Orlando Rocha de Carvalho.
De acordo com José Orlando Rocha de Carvalho, existiriam apenas os chamados pressupostos processuais de existência, estes sim ligados à noção de existência do processo, sendo que os tradicionalmente denominados  pressupostos processuais de validade seriam chamados de Requisitos de Validade da relação processual.
Neste diapasão, devido à sua clarividência, mister se faz trazer à baila alguns trechos da grandiosa obra de José Orlando Rocha de Carvalho (2005, págs. 67; 71), in verbis:

"Ficou devidamente evidenciado que pressuposto é o que vem antes; é o antecedente necessário de algo; ou aquilo que se supõe existir, para dar existência a alguma coisa.
Já requisito, consoante os léxicos significa "condição que se deve satisfazer para alcançar certo fim (...).
(...)
Portanto, pressuposto de um fato jurídico é a sua existência real e efetiva. É o ser, o existir, cuja verificação se dá em dois planos: a) pela sua ocorrência no plano dos fatos do mundo; b) por ter sido juridicizado em face da incidência da norma jurídica.
(...) Se o pressuposto é o que vem antes; se é o antecedente de algo, obviamente que o pressuposto não poderia ser algo que vem depois da existência. Mas, sim, algo ligado à própria existência. Está, pois, o pressuposto de um fato jurídico ligado ao plano da causalidade ou da facticidade.
Deste modo, e como o tema em apreciação diz respeito aos pressupostos processuais, não se poderá entender sejam eles algo que não esteja no plano da existência do processo. Se há pressupostos do processo, portanto, estes (pressupostos) somente poderão (e deverão) estar vinculados ao plano da existência do próprio processo e não à sua validade (...) - grifos nossos

Cumpre ainda destacar, que de acordo com o supracitado autor baiano, foi a doutrina italiana - através de Chiovenda - que desconfigurou a Teoria clássica desenvolvida por Oskar Von Bulow² acerca dos pressupostos processuais (em que estariam apenas ligados à existência do processo), acrescendo a existência dos pressupostos processuais de validade. 
Desta forma, tendo em vista que a doutrina majoritária brasileira é seguidora do referido autor italiano, tem-se ainda que o nosso ordenamento jurídico processual foi expresso em admitir a classificação proposta por Chiovenda e positivada por nosso legislador no Art. 267, IV do Código de Processo Civil brasileiro, quando preceitua que extingue-se o processo, sem resolução do mérito, quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição (existência) e de desenvolvimento válido e regular do processo (validade).
Ademais, José Orlando Rocha de Carvalho pontifica que o acatamento da existência dos pressupostos de validade obstaculizam o cidadão ao livre acesso à jurisdição, uma vez que admitem que o magistrado ponha fim à relação processual por simples falta de requisitos de validade, gerando desta forma a ocorrência de non liquet, figura vedada aos juízes brasileiros, conforme previsão encartada no Art.126 do CPC (O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”).
Diante o exposto, preciso se faz que a doutrina jurídica brasileira reflita³ a respeito da efetiva existência dos pressupostos processuais de validade - acatando a proposta feita pelo eminente jurista José Orlando Rocha de Carvalho -, sufragando, portanto, a existência dos Pressupostos Processuais de Existência e dos Requisitos Processuais de Validade.





Notas:
¹ Por todos, conferir: CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume I. 21ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

² BÜLOW, Oskar von. La Teoria de las Excepciones Procesales y los Presupuestos Procesales. Trad. Miguel Angel Rosas Lichtschein. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa - América, 1964.
³ Anote-se, que o eminente processualista baiano, Fredie Didier Jr., adota a proposta sufragada por José Orlando Rocha de Carvalho, dedicando, inclusive, capítulo específico em seu livro Curso de Direito Processual Civil - Vol. 1, página 218 ("Capítulo V, Os "pressupostos processuais", 3. A classificação proposta, baseada na obra de José Orlando Rocha de Carvalho"). 


Referências:
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume I. 21ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

CARVALHO, José Orlando Rocha de. Teoria dos Pressupostos e dos Requisitos Processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. 11ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2009.



Como citar este texto:
GOMES, Adão Mendes. Reflexões criticas sobre a tradicional Teoria dos Pressupostos Processuais. O Direito na Berlinda.   Disponível:http://adaomendesdireitouneb.blogspot.com.br/2012/01/reflexoes-sobre-teoria-dos-pressupostos.htmlAcesso em: dia, mês e ano.

2 comentários:

  1. Deveras a Teoria dos Pressupostos defendida por José Orlando Rocha de Carvalho é muito fascinante, e, ao meu ver, é também correta, pois a ideia de pressupostos está estritamente ligada à existência, isto é, jamais à validade...

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  2. Olá, caro leitor, também penso assim, e, neste caso, sugiro a você a leitura do livro Teoria dos Pressupostos e dos Requisitos Processuais, de José Orlando, leitura obrigatória sobre o tema...
    abraço..

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