sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A pena mínima do crime de estupro deveria ser de pelo menos 8 (oito) anos de reclusão


Infelizmente, ao contrário do que muita gente pensa, quem comete o gravíssimo crime de estupro - frise-se, em sua forma simples: art.213 do Código Penal: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. Pena - Reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos" - costuma (isto é, na maioria das vezes) ter sua pena definitiva fixada no mínimo legal, qual seja, 6 (seis) anos de reclusão.
Para quem conhece nosso Sistema de Aplicação da Pena, constante no art.68 c/c com o art.59, todos do Código Penal brasileiro, sabe que grande parte (diz-se em grande parte, pois, em homenagem ao princípio da individualização da pena (art.5º, XLVI, CF/88), a pena de cada caso vai depender das circunstâncias objetivas e subjetivas de cada criminoso e dos crimes praticados) dos estupradores acaba por ter sua pena fixada no montante mínimo, ou seja, de 6 (seis) anos.
Tal constatação é relevante e possui grave consequência jurídica, frise-se, não sabido pela maioria da população brasileira, qual seja, devido a fixação da pena em seu patamar mínimo (seis anos), o condenado NÃO IRÁ para o regime fechado de cumprimento da pena, mas para o regime semi-aberto, tendo em vista que sua pena fora fixada em quantidade inferior a 8 (oito) anos de reclusão, nos termos do art.33, §2º, do Código Penal: "As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (...) b) o condenado não reincidente cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;"
Assim, ao invés do condenado por estupro ir cumprir sua pena no presídio (regime fechado), ele irá para o regime semi-aberto, onde cumprirá a pena numa colônia penal (art.35, §1º, CP), sendo possível ainda exercer trabalho externo e ainda, a participação em cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau e superior fora da referida colônia penal (art.35, §2º, CP).
Essa é a regra. A exceção fica por conta do condenado reincidente, pois, mesmo que sua pena tenho sido fixada em 6 (seis) anos, o que vale também no caso do estupro, ele deverá iniciar o cumprimento da sanção corporal em regime fechado. Reincidente é o indivíduo que vem a praticar novo crime antes de passar pelo menos 5 (cinco) anos após o trânsito em julgado que o condenou anteriormente, seja no Brasil ou no estrangeiro, pela prática de algum outro delito, conforme se depreende da leitura conjunta dos arts.63 e 64 do Código Penal.
Desta forma, é preciso deixar claro, que em regra (desde que o condenado não seja reincidente), o condenado por estupro não irá iniciar o cumprimento de sua pena em regime fechado (no presídio), isto porque, o juiz, ao fixar a pena analisando as circunstâncias constantes do art.59 do Código Penal (bem como as demais fases) - atente-se, partindo sempre do montante mínimo (seis anos) -, em grande parte dos casos não conseguirá aumentar a pena até 8 (oito) anos ou mais, hipótese em que o condenado por estupro começaria a cumprir sua pena em regime fechado.
A nosso ver, o problema não está no Sistema da Fixação da Pena, mas sim na ausência de proporcionalidade da pena mínima atribuída ao crime de estupro, qual seja, de apenas 6 (seis) anos de reclusão.
Como é cediço, o delito do estupro é uma conduta socialmente repugnante e considerada gravíssima por toda a sociedade brasileira, sendo um dos crimes que mais chocam por sua virulência, chegando ao ponto dos demais presidiários (e/ou criminosos) não aceitarem de forma nenhuma quem pratica o referido crime.
Por outro lado, não podemos esquecer que o delito de estupro - ante a enorme gravidade de suas consequências no seio da sociedade e principalmente para as vítimas, as quais em sua grande maioria passam a conviver com problemas psicológicos e de relacionamento - é considerado crime hediondo, nos termos do art.1º, inciso V, da Lei nº 8.072/1990.
Assim, temos que a pena mínima do crime de estupro não é proporcional à enorme gravidade da referida conduta delituosa. Como se sabe, a pena a ser atribuída pelo legislador para determinada conduta considerada criminosa deve guardar proporcionalidade com a conduta violadora da lei penal incriminadora, o que, a nosso ver, não acontece com pena mínima do delito de estupro em sua forma simples. Sobre a proporcionalidade, LUIZ REGIS PRADO ensina que:

O princípio da proporcionalidade (poena debet commensurari delicto), em sentido estrito, exige um liame axiológico e, portanto, graduável, entre o fato praticado e a cominação legal/consequência jurídica, ficando evidente a proibição de qualquer excesso. [...]
(...)
Em resumo, a pena deve estar  proporcionada ou adequada à intensidade ou magnitude da lesão ao bem jurídico representada pelo delito e a medida de segurança à periculosidade criminal do agente. (Curso de direito penal brasileiro - Parte Geral. 10ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p.151).

Na mesma senda, sobre a proporcionalidade, FERNANDO CAPEZ leciona que, in verbis:

Além disso, a pena, isto é, a resposta punitiva estatal ao crime, deve guardar proporção com o mal infligido ao corpo social. Deve ser proporcional à extensão do dano, não se admitindo penas idênticas para crimes de lesividade distintas, ou para infrações dolosas e culposas. (Curso de Direito Penal - Parte Geral. 16ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p.40). - negritei

Outro não é o entendimento de GUILHERME DE SOUZA NUCCI:

Ao elaborar tipos penais incriminadores deve o legislador inspirar-se na proporcionalidade, sob pena de incidir em deslize grave, com arranhões inevitáveis a preceitos constitucionais. Não teria sentido, a título de exemplo, prever pena de multa a um homicídio, como também não se vê como razoável a aplicação de pena privativa de liberdade elevada a quem, com a utilização de aparelho sonoro em elevado volume, perturba o sossego de seu vizinho. [...]
(...)
A tarefa do criador da norma penal é, baseando-se na proporcionalidade das sanções penais destinadas aos crimes praticados, estipular as penas. (Individualização da Pena. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.40)

Desta forma, temos que a fixação da pena do delito de estupro (na sua forma simples, isto é, a do caput do art.213 do CP) pelo legislador brasileiro à margem mínima de 6 (seis) anos viola o princípio constitucional da proporcionalidade. A nosso ver, a pena mínima deveria ser de pelo menos 8 (oito) anos, tal como já é previsto para o estupro qualificado (art.213, §§ e 1º e 2º do Código Penal) e para o Estupro de Vulnerável (art.217-A do CP), o que em regra acarretaria aos condenados por estupro começarem a cumprir a pena em regime fechado, nos termos do art.33, §2º, "a", do Código Penal.







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