No dia 25 de fevereiro de 2013 foi publicado no DJe do Superior Tribunal de Justiça, o acórdão que negou seguimento ao Recurso Especial nº 1.288.971-SP (link abaixo) interposto por Alexandre Nardoni, o qual pleiteava que fosse provido seu recurso para que lhe fosse garantido o direito ao suprimido recurso intitulado Protesto por novo júri, o qual fora extirpado de nosso ordenamento jurídico através da Lei nº 11.689/2008.
Como é sabido, o recurso (extinto em 2008) protesto por novo júri era cabível contra as condenações proferidas no Tribunal do Júri em que pelo menos a pena de um dos crimes (obviamente se houvesse mais de um) atingisse 20 (vinte) anos ou mais.
Segundo Nardoni, "a norma que estatuía o recurso de protesto por novo júri, art. 607 do CPP, apesar de ser a regra processual (não negamos), possui nítido reflexo material, já que atrelada a direitos fundamentais e à pena, exigindo, nesse passo, tivesse aplicação ultrativa, na forma dos artigos 1.º e 2.º, caput e parágrafo único, do Código Penal".
Conforme dito inicialmente, ao referido Recurso Especial foi negado seguimento de forma monocrática pela Relatora, a Min.Laurita Vaz, a qual o considerou manifestamente improcedente e contrário à jurisprudência dominante do STJ (art.557, Código de Processo Civil). Neste ponto, calha trazer à baila trecho do referido decisum, in verbis:
A norma exclusivamente processual, como é o caso do dispositivo em questão, se submete ao princípio tempus regit actum, ou seja, a lei processual penal deve ser aplicada a partir de sua vigência, conforme preconizado no art.2.º do Código de Processo Penal, in verbis: "A lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior".
Assim, a norma que exclui recurso tem vigência de imediato, sem prejuízo dos atos já praticados. Vale observar que, para a aferição da possibilidade de utilização de recurso suprimido, a lei que deve ser aplicada é aquela vigente quando surge para a parte o direito subjetivo ao recurso, ou seja, a partir da publicação da decisão a ser impugnada.
(...)
Dessa forma, constata-se que os sentenciados não fazem jus ao protesto pelo novo júri, porque, embora o crime tenha ocorrido antes da vigência da Lei nº 11.689/2008, que retirou o recurso da lei processual, o julgamento perante o 2.º Tribunal do Júri de São Paulo/SP foi concluído em 26 de março de 2010, portanto, quando já estava em vigor a novel legislação. (grifo nosso)
Concordamos completamente com os fundamentos elencados pela douta Min.Laurita Vaz. De fato, os referidos recorrentes não têm direito ao recurso protesto por novo júri (felizmente, suprimido da nossa legislação processual penal em 2008), vez que o direito a qualquer recurso "nasce" somente quando da publicação da decisão a ser impugnada, de sorte que, se na época em que foram condenados (26.03.2010) o recurso não existia mais, não há que se falar em prejuízo processual, pois, como bem explicitado pela douta Ministra, "A norma exclusivamente processual, como é o caso do dispositivo em questão, se submete ao princípio tempus regit actum, ou seja, a lei processual penal deve ser aplicada a partir de sua vigência, conforme preconizado no art.2.º do Código de Processo Penal, in verbis: "A lei processual aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior."
Por oportuno, devido à clareza de suas observações, calha trazer à baila os ensinamentos do insigne processualista penal Eugênio Pacelli de Oliveira, que ao comentar sobre a legislação processual no tempo, pontifica que:
[...] no que se refere às leis processuais no tempo, segue-se a regra de toda legislação processual: aplicam-se de imediato, desde a sua vigência, respeitando, porém, a validade dos atos realizados sob o império da legislação anterior.
Por atos já praticados deve-se entender também os respectivos efeitos e/ou consequências jurídicas. Por exemplo: sentenciado o processo e em curso o prazo recursal, a nova lei processual que alterar o aludido prazo não será aplicada, respeitando-se os efeitos preclusivos da sentença tal como previstos na época de sua prolação.
Questão da maior importância, ao menos nos próximos anos, diz respeito à recente modificação trazida com a Lei nº 11.689/08, que, modificando o procedimento do Tribunal do Júri, fez desaparecer, revogando expressamente, o antigo protesto por novo júri (arts.607 e 608, CPP). Uma vez vigente a nova regra, a partir do dia 10 de agosto de 2008, qual seria o marco de sua aplicação? A decisão condenatória, por força da aplicação imediata das novas regras processuais, ou a data do fato praticado? Uma leitura pautada essencialmente na perspectiva da afirmação das garantias processuais do acusado responderá que a modificação - extinção de uma modalidade de recurso - implicaria diminuição das garantias recursais, de tal modo que haveria violação, ou à ampla defesa, ou a suposto direito adquirido do agente da infração. Assim, por essa interpretação, a nova regra somente seria aplicável aos fatos praticados a partir de sua vigência, isto é, a partir de 10 de agosto de 2008.
Pensamos, contudo, que a questão não pode ser colocada nestes termos. Evidentemente que a possibilidade, em abstrato, de outra via recursal em favor do acusado amplia o seu leque defensivo. No entanto, não se pode afirmar que a eventual supressão de uma modalidade de recurso implique violação ao princípio constitucional da ampla defesa. Fosse assim, a legislação processual penal estaria condenada ao engessamento e à fossilização, e, pior ainda, vinculada a um padrão de procedimento estabelecido justamente em um mesmo instrumento normativo, isto e, outra Lei. E, sabe-se, leis revogam leis, quando da mesma espécie normativa. Então, em linha de princípio, pode haver alterações procedimentais, incluindo e alcançando a matéria recursal, desde que garantida a possibilidade de revisão do julgado em outra instância.
(...)
Assim, pensamos que o marco de aplicação da nova regra, fim do protesto por novo júri, é a decisão condenatória no Tribunal do Júri. Se já proferida ela, antes da nova legislação (Lei nº 11.689/08), deve ser aceito o recurso de protesto por novo júri. Se a condenação é posterior, aplica-se imediatamente a nova regra processual. (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Pág. 24/26). (itálico e negrito nossos)
No mesmo diapasão, outro não é o entendimento de Guilherme de Souza Nucci: "a extinção do protesto por novo júri, provocada pela Lei 11.689/2008, deve ter aplicação imediata, tão logo entre em vigor o corpo de normas que alteraram a configuração do Tribunal do Júri. Segue-se sem dúvida, o disposto no art. 2.º do Código de Processo Penal: "A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior". Significa, pois, que todo réu que estiver respondendo a processo, no contexto do júri, ao atingir a sentença condenatória, proferida em plenário, com pena fixada em 20 anos ou mais, já não terá direito de invocar o protesto por novo júri. Afinal, no momento processual em que alcançou a decisão condenatória e, portanto, poderia, em tese, fazer uso de um recurso colocado à sua disposição pela legislação, em autêntica expectativa de direito, o mencionado recurso deixou de existir. Normas processuais aplicam-se de imediato, sem qualquer retroatividade. Essa é a regra." (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 9ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. Págs. 985/986). (grifo nosso)
Por fim, cabe destacar, que da referida decisão monocrática ainda cabe recurso, notadamente o Agravo Regimental, cujo objetivo é que o pedido (ora negado seguimento) seja julgado pelo órgão colegiado competente do próprio STJ.
*Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/websecstj/decisoesmonocraticas/frame.asp?url=/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=27131833&formato=PDF