terça-feira, 30 de outubro de 2012

STF decide que a imposição legal de cumprimento de pena em regime inicialmente fechado nos crimes hediondos É INCONSTITUCIONAL

O Supremo Tribunal Federal, finalmente, em decisão histórica realizada no mês de junho do corrente ano (2012), ao analisar o HC nº 111.840/ES¹, Relator Min. Dias Toffoli, julgou que a obrigatoriedade de cumprimento de pena aos condenados por crimes hediondos e assemelhados em regime inicialmente fechado (art.2º, §1º da Lei nº 8.072/90) é inconstitucional, uma vez que viola o Princípio constitucional da Individualização da Pena (art.5º, XLVI, CF/88).
No caso do citado HC, o impetrante foi condenado à pena de 06 anos de reclusão pelo cometimento do crime de tráfico de drogas, a ser cumprido em regime inicial fechado, não obstante possuir circunstâncias judiciais favoráveis, o que lhe garantiria a eleição de regime semi-aberto.
Insta registrar que o julgamento do STF foi incidental de inconstitucionalidade, ou seja, seus efeitos valem somente naquele caso específico, o que equivale a dizer que o referido dispositivo está em pleno vigor em nosso ordenamento jurídico, tanto é que, no dia 11.10.12, o juízo da 12ª Vara Criminal de Barra Funda, na Capital Paulista, fixou regime de cumprimento de pena inicialmente fechado a um condenado por tráfico de drogas a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, fundamentado no referido art.2º, §1º da Lei nº 8.072/90. Neste diapasão, em artigo publicado na internet (29.10.2012), o eminente jurista Luiz Flávio Gomes², ao analisar a decisão da 12ª Vara  Criminal paulista, obtemperou que:

A juíza, ao fixar a pena, considerou o fato de o acusado ser primário, não possuir antecedentes, confessar a prática do tráfico e não haver indício de que faça parte de alguma organização criminosa para reduzir a pena base em 2/3. Mesmo assim, fixou o regime inicial fechado para cumprimento de pena por se tratar de crime hediondo (negrito nosso).

Desta forma, percebe-se que a magistrada paulista aplicou integralmente a determinação da Lei de Hediondos, que fixa o regime inicial fechado, independentemente do quantum aplicado na sentença e das circunstâncias judiciais favoráveis ao condenado (art.33, §2º, b, do CP), contrariamente ao entendimento firmado pelo STF, frise-se, nesse ano, quando do julgamento do HC nº 111.840/ES.
O referido dispositivo da Lei dos Crimes Hediondos, fixa de forma autoritária que os condenados por crimes hediondos (e assemelhados, como por exemplo o tráfico de drogas e entorpecentes) deveriam iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, tirando, desta forma, o prudente arbítrio do juiz para fixar o regime de cumprimento da pena necessário e suficiente para cada indivíduo infrator da lei penal.
Como se sabe, no julgamento do HC nº 82.959/SP (DJ de 01.09,2006), Relator Min. Marco Aurélio, o STF, mudando seu entendimento sobre o tema, entendeu que a vedação de progressão de regime aos condenados por crimes hediondos era inconstitucional por também ferir o Princípio da Individualização da Pena, in casu, na terceira etapa da individualização, qual seja, a fase da execução da pena. A partir desta decisão do STF, o legislador através da Lei nº 11.464/2007, alterou a Lei de Crimes Hediondos, passando a aceitar a progressão de regime aos condenados por estes crimes, mas determinou, frise-se, de forma indevida (ou melhor inconstitucional), que o cumprimento da pena seria inicialmente fechado.
No que tange ao entendimento exarado no HC nº 111.840/ES, concordamos plenamente com Pretório Excelso, uma vez que a fixação de cumprimento de pena em regime inicial fechado também violenta o Princípio da Individualização da Pena, tendo em vista que subtrai do magistrado a opção que melhor se ajusta ao caso concreto, pois se sabe que, no momento da escolha do regime de cumprimento da pena, o juiz deverá analisar as circunstâncias judiciais encartadas no art.59 do Código Penal (como por exemplo, a culpabilidade, antecedentes, personalidade, circunstâncias e motivo do crime, etc.,) e, caso estas sejam favoráveis ao condenado, poderá influir na eleição do regime de cumprimento da reprimenda. 
De fato, a lei de crimes hediondos fixava a eleição de regime inicial fechado independentemente do quantum estabelecido na sentença penal condenatória, seja 1 (um) ano ou 15 (quinze) anos, todos devem iniciar o cumprimento da pena em regime fechado. Vê-se que tal entendimento não é consentâneo com os Princípios da Individualização da pena, Razoabilidade e Proporcionalidade que devem nortear a atividade jurisdicional. Neste diapasão, confira a ementa do julgamento do HC nº 111.840/ES, de relatoria da lavra do Min. Dias Toffoli:

Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado
durante  a  vigência  da  Lei  nº  11.464/07.  Pena  inferior  a  8  anos  de
reclusão.  Obrigatoriedade  de  imposição  do  regime  inicial  fechado.
Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei
nº  8.072/90.  Ofensa  à  garantia  constitucional  da  individualização  da
pena (inciso XLVI do art. 5º da CF/88). Fundamentação necessária (CP,
art. 33, § 3º, c/c o art. 59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do
regime semiaberto para o início de cumprimento da pena privativa de
liberdade. Ordem concedida.
1. Verifica-se que o delito foi praticado em 10/10/09, já na vigência da
Lei  nº  11.464/07,  a  qual  instituiu  a  obrigatoriedade  da  imposição  do
regime inicialmente fechado aos crimes hediondos e assemelhados.
2.  Se  a  Constituição  Federal  menciona  que  a  lei  regulará  a
individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os
critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar
com  as  garantias  constitucionais,  sendo  necessário  exigir-se  sempre  a
fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo
ou equiparado.
3. Na situação em análise, em que o paciente, condenado a cumprir
pena  de  seis  (6)  anos  de  reclusão,  ostenta  circunstâncias  subjetivas
favoráveis, o regime prisional, à luz do art. 33, § 2º, alínea b, deve ser o
semiaberto.
4. Tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o magistrado,
em  eventual  apreciação  das  condições  subjetivas  desfavoráveis,  vir  a
estabelecer regime prisional mais severo, desde que o faça  em razão de
elementos  concretos  e  individualizados,  aptos  a  demonstrar  a
necessidade  de  maior  rigor  da  medida  privativa  de  liberdade  do
indivíduo, nos termos do § 3º do art. 33, c/c o art. 59, do Código Penal.
5. Ordem concedida tão somente para remover o óbice constante do
§ 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/07,
o qual determina que “[a] pena por crime previsto neste artigo será cumprida
inicialmente  em  regime  fechado“.  Declaração  incidental  de
inconstitucionalidade, com efeito ex nunc, da obrigatoriedade de fixação
do regime fechado para início do cumprimento de pena decorrente da
condenação por crime hediondo ou equiparado.


Ademais, no dia 25.09.2012, a Primeira Turma do STF, através do voto da Min. Rosa Weber, ao analisar o HC nº 107.407/MG³, ratificou o entendimento esposado no julgamento do HC nº 111.840/ES, fixando regime inicial diverso do fechado a condenado a 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias por tráfico de drogas. In casu, a douta Ministra fixou o regime semi-aberto, eis a ementa de seu julgado:

DIREITO  PENAL.  HABEAS  CORPUS.  TRÁFICO  DE  DROGAS.
DOSIMETRIA.  REGIME  INICIAL  DE  CUMPRIMENTO  DA  PENA.
INCONSTITUCIONALIDADE  DO  §  1º  DO  ARTIGO  2º  DA  LEI  Nº
8.072/90.  POSSIBILIDADE  DE  IMPOSIÇÃO  DE  REGIME  INICIAL
DIVERSO DO FECHADO. 
1. Em sessão realizada em 27.6.2012, no HC 111.840/ES, rel. Min.
Dias  Toffoli,  o  Pleno  desta  Suprema  Corte  declarou  a
inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei 8.072/90, com a redação
dada pela Lei 11.464/07, que consagrara a obrigatoriedade de imposição
do  regime  inicial  fechado  para  o  cumprimento  da  pena  de  crimes
hediondos e equiparados.
2. Em absoluto ignorou-se o caráter danoso do tráfico de drogas na
sociedade  moderna,  a  reclamar,  em  geral,  tratamento  jurídico  mais
rigoroso,  permitindo  apenas,  forte  no  postulado  constitucional  da
individualização  das  penas,  a  concessão  de  regime  inicial  de
cumprimento de pena diverso do fechado, quando circunstancialmente
viável.
3. A fixação do regime inicial de cumprimento da pena não está
condicionada somente ao quantum da reprimenda, mas também ao exame
das  circunstâncias  judiciais  do  artigo  59  do  Código  Penal,  conforme
remissão  do  art.  33,  §3º,  do  mesmo  diploma  legal.  Em  tese,  viável  a
imposição de regime inicial fechado mesmo para o cumprimento de pena
inferior a oito anos em condenações por tráfico de drogas. Se a decisão
atacada  fixou,  porém,  o  regime  fechado  tão  somente  com  base  no
dispositivo reputado inconstitucional, impõe-se a revisão.
4. Habeas corpus concedido.



Referências

1. HC nº 111.840/ES disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/hc111840dt.pdf

2. Disponível em: http://atualidadesdodireito.com.br/lfg/2012/10/29/drogas-regime-inicial-fechado-inconstitucionalidade-da-lei/

3. HC nº 107.407/MG disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2926620




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