A violência e morte de mulheres
no Brasil cresce assustadoramente, razão pela qual foi editada a Lei Maria da
Penha (Lei 11.340/2006) e, posteriormente, a Lei 13.104/2015, que criou a
figura do Feminicídio, isto é, a morte de mulheres em decorrência do simples
fato da vítima pertencer ao sexo feminino.
De acordo com Francisco Dirceu
Barros e Renee do Ó Souza (2021, p.24): “Feminicídio pode ser definido como uma
qualificadora do crime de homicídio motiva pelo ódio contra as mulheres ou
crença na inferioridade da mulher, caracterizado por circunstâncias específicas
nas quais o pertencimento da mulher ao sexo feminino é central na prática do
delito.”
Inicialmente cabe destacar que a
Lei 13.104/2015 tratou o Feminicídio como uma qualificadora – inciso VI do §2º
do art.121 do CP: “Matar mulher por razões da condição do sexo feminino” - do
crime de homicídio (art.121, Código Penal), ou seja, não se tratava de uma
infração penal autônoma, ao contrário do quanto trazido agora pela Lei 14.994,
de 09 de outubro de 2024.
Acerca das qualificadoras, já
tive a oportunidade de me manifestar em minha obra Aplicação da Pena:
doutrina e jurisprudência (2020, p.202-203): “As qualificadoras, embora se
tratem de circunstâncias também ligadas ao fato delituoso ou ao agente, elas
servem para inaugurar um tipo penal mais gravoso, isto é, que possuam uma pena
mais grave que a do delito na sua forma simples. [...] Assim, constatada a
existência de uma qualificadora, o tipo penal na sua forma simples será
desconsiderado, [...] no caso da prática de homicídio (art.121, CP), o qual tem
pena de 6 a 20 anos (homicídio simples), caso reste comprovado que o referido
delito foi praticado mediante promessa de recompensa (art.121, §2º, I, CP),
aquela pena será desconsiderada pelo julgador, o qual deverá aplicar a sanção a
partir da pena mínima de 12 (doze) anos e máxima de 30 (trinta) anos.”
O §2º-A do art.121 do CP, trazido
pela Lei 13.104/2015 dispunha, in verbis: Considera-se que há razões da
condição do sexo feminino quando o crime envolve:
I – violência doméstica e
familiar;
II – menosprezo ou discriminação
à condição de mulher.
Insta registrar que a Lei 14.994/2024
revogou o aludido §2º-A do art.121 do CP, porém, manteve a referida
conceituação/explicação no §1º do art.121-A do CP.
Parte da doutrina já vinha
criticando o termo utilizado pelo legislador de matar em decorrência da “condição
do sexo feminino”. Nesse ponto, ao comentar a Lei 14.994/2024, Amanda Bessoni
Boudoux Salgado registrou que:
“Perdeu-se a
oportunidade de aperfeiçoar a norma, por exemplo, no seu próprio aspecto
conceitual, ou seja, na proposta de um modelo de tipificação mais claro e
preciso, que não fosse tão dependente de fórmulas subjetivas e internas como a
referência ao “menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.
Outra grande
oportunidade perdida foi a de adequar a definição legal ao desenvolvimento
sociológico da categoria do feminicídio pela substituição da palavra “sexo” por
“gênero”, haja vista que o fundamento material da figura está muito mais
relacionado a esta última categoria.”
Da análise da novel Lei 14.994/2024,
com relação a questão penal do feminicídio, verifica-se que ela basicamente
repetiu a normatização trazida pela Lei 13.104/2015, com exceção de poucos de
seus dispositivos, conforme se observará. Observemos o atual panorama legal
dado ao feminicídio, in verbis:
Art. 121-A.
Matar mulher por razões da condição do sexo feminino: (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
Pena –
reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos. (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
§ 1º
Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime
envolve: (Incluído pela Lei nº
14.994, de 2024)
I – violência
doméstica e familiar; (Incluído pela
Lei nº 14.994, de 2024)
II –
menosprezo ou discriminação à condição de mulher. (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
§ 2º A pena
do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime é
praticado: (Incluído pela Lei nº
14.994, de 2024)
I – durante a
gestação, nos 3 (três) meses posteriores ao parto ou se a vítima é a mãe ou a
responsável por criança, adolescente ou pessoa com deficiência de qualquer
idade; (Incluído pela Lei nº 14.994,
de 2024)
II – contra
pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência
ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de
vulnerabilidade física ou mental;
(Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
III – na
presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima; (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
IV – em
descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e
III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da
Penha); (Incluído pela Lei nº 14.994,
de 2024)
V – nas
circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do art. 121 deste Código. (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
Coautoria (Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
§ 3º
Comunicam-se ao coautor ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do
crime previstas no § 1º deste artigo.
(Incluído pela Lei nº 14.994, de 2024)
Inicialmente, verifica-se desde
logo que o termo - “Matar mulher por razões da condição do sexo feminino”
(inciso VI do §2º do art.121 do CP) - que antes era qualificadora do homicídio
qualificado, passou a ser o tipo penal denominado de Feminicídio.
Outrossim, digno de nota é o preceito secundário do tipo penal do feminicídio, que se distanciando do
homicídio qualificado (cuja pena mínima contina a ser de 12 a no máximo 30
anos), a pena mínima foi estabelecida em 20 anos e no máximo de 40 anos,
adaptando-se à nova redação do Art. 75 do Código Penal, que estabelece que o
tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a
40 (quarenta) anos, conforme Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019.
Embora o recrudescimento da pena
seja importante como forma de intimidação (prevenção geral negativa) para os
feminicidas, a prática demonstra que a dureza das penas não é o suficiente para
reduzir a criminalidade (o que já era defendido por Cesare Beccaria ainda no Século XVIII).
Nesse sentido, ainda ao comentar
a Lei 14.994/2024, Amanda Bessoni Boudoux Salgado destacou que “[...] o que se
extrai da Lei n° 14.994/2024 é ainda o predomínio discrepante do paradigma
reativo, atrelado ao recrudescimento de penas, que pouco adiciona ao debate
sobre o que funciona em termos de prevenção da violência de gênero.
Sintomático, aliás, que os números de feminicídios e de outras formas de
violência contra as mulheres tenham apresentado crescimento nos últimos anos”.
No que se refere às causas de
aumento de pena do feminicídio, as mesmas continuam tendo o quantum de
aumento entre 1/3 (um terço) até a metade, nas mesmas hipóteses antes trazidas
pela Lei 13.104/2015, com as seguintes exceções.
Manteve-se a causa de aumento de
pena se o crime é cometido durante a gestação, nos 3 (três) meses posteriores
ao parto, agora previsto no inciso I do §2º do art.121-A do CP, mas
acrescentou-se ao referido inciso o aumento também para a hipótese se a
vítima é a mãe ou a responsável por criança, adolescente ou pessoa com
deficiência de qualquer idade.
Conforme o Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), Lei 8.069/1990, seu Art. 2º estabelece que se considera
criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade
incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Por seu turno, a Lei 13.146/2015
(Estatuto da pessoa com deficiência), em seu art. 2º, define que se considera
pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas.
No que se refere à hipótese de
descumprimento das medidas protetivas de urgência impostas no âmbito da Lei
Maria da Penha, confira as hipóteses legais, in verbis:
Art. 22.
Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos
termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto
ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com
comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº
10.826, de 22 de dezembro de 2003 ;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com
a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das
testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por
qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a
integridade física e psicológica da ofendida;
Destarte, caso o feminicídio
ocorra através do descumprimento de alguma das medidas protetivas de urgência
previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de
agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), haverá o aumento da pena.
Outra novidade digna de nota é a nova
causa de aumento de pena de 1/3 (um terço) até a metade, elencada no inciso
V do §2º do art.121-A do CP, que estabelece o aumento de pena nas
circunstâncias previstas nos incisos III (com emprego de veneno, fogo,
explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa
resultar perigo comum), IV (à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação
ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido) e VIII
(com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido) do § 2º do art.
121 deste Código (homicídio qualificado).
Em outras palavras, enquanto os
incisos III, IV e VIII do § 2º do art. 121 deste Código (homicídio
qualificado) são circunstâncias – qualificadoras - que tornam o homicídio
qualificado, no feminicídio elas são causas de aumento da pena, a incidir na
terceira fase da dosimetria da pena.
Quanto à lei penal no tempo,
considerando que a Lei 14.994/2024, de 9 de outubro de 2024 (data que entrou em
vigor), além de aumentar as penas mínima e máxima do feminicídio e instituir
novas hipóteses de causas de aumento da pena, tem-se que a mesma é norma penal
prejudicial ao réu, razão pela qual as novas disposições somente se aplicam
para os feminicídios praticados a partir da entrada em vigor da Lei 14.994/2024,
isto é, 9 de outubro de 2024, nos termos do art.5º da CF (XL - a lei penal não
retroagirá, salvo para beneficiar o réu).
Sendo assim, aos feminicídios
praticados até 8 de outubro de 2024, não se aplicam a pena mínima de 20 anos e
a máxima de 40 anos, nem tampouco as causas de aumento previstas na parte final
do inciso I e nem o inciso V, todos do §2º do art.121-A do Código Penal, vez
que a Lei 14.994/2024 é norma penal prejudicial e, portanto, irretroativa,
conforme previsão constitucional.
No que se refere à competência para julgamento, importa registrar,
que por se tratar o feminicídio de um crime contra a vida, a competência para o
processo e julgamento dele será do Tribunal do Júri, o que faz incidir algumas
peculiaridades. No meu livro Aplicação da Pena (2020, p.213), no tocante
a causas de aumento no âmbito do tribunal do júri, lecionei que:
O julgamento perante o
Tribunal do Júri também possui peculiaridades no que toca às regras sobre o
reconhecimento de qualificadoras e causas de aumento da pena.
Isto acontece, pelo fato do
Tribunal do Júri ser o único competente para o julgamento dos crimes dolosos
contra a vida, possuindo soberania o veredicto, conforme regra do inciso
XXXVIII do art.5º da CF/88.
Assim, não há possibilidade
do juiz na prolação da sentença reconhecer de ofício a existência de
qualificadoras e causas de aumento ou diminuição da pena ou qualificadoras ou
privilegiadoras, pois tais circunstâncias só podem ser reconhecidas pelo Tribunal
do Júri, sendo que ao magistrado cabe apenas aplicá-las na decisão
condenatória, sendo este o entendimento do STJ, conforme se observa da decisão
constante do AgRg no HC 468460/MS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, 6ª Turma, DJe
02/12/2019.
Relembre-se da regra do Art. 483 do CPP, que dispõe que os quesitos serão
formulados na seguinte ordem, indagando sobre: § 3o
Decidindo os jurados pela condenação, o julgamento prossegue, devendo ser
formulados quesitos sobre: II – circunstância qualificadora ou causa
de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que
julgaram admissível a acusação.
Dito de outra forma, no âmbito do
tribunal do júri, o juízo só pode aplicar causas de aumento da pena que tenham
sido autorizadas pelo Conselho de Sentença, pois o tribunal do júri é o único
órgão competente para julgar causas penais referentes a crimes contra a vida.
Ademais, cabe chamar a atenção
para o fato da Lei 14.994/2024 não ter alterado o CPP na parte que trata da
competência do tribunal do júri para julgar os crimes contra a vida, in
verbis: “art.74, § 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes
previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e
127 do Código Penal, consumados ou tentados.”
Com efeito, o art.121-A do CP não
foi inserido no §1º do art.74 do CPP, o que poderia levar à dúvida de que se o
feminicídio seria julgado pelo tribunal do júri. Todavia, considerando de que
não há dúvidas de que o feminicídio é um homicídio praticado contra mulheres
por causa das condições previstas no §1º do art.121-A do CP, tem-se que ele é
um crime contra a vida, sendo mais do que suficiente a previsão constitucional de
competência do tribunal do júri para os casos de infrações penais contra a vida
(art.5º, XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que
lhe der a lei, assegurados: d) a competência para o julgamento dos crimes
dolosos contra a vida).
De fato, tendo em vista a supremacia das normas constitucionais, é irrelevante que a Lei 14.994/2024 não tenha alterado o CPP na parte que trata da competência do tribunal do júri para julgar os crimes contra a vida e nela inserido a competência do júri para julgar o feminicídio.
Outrossim, cabe analisar o
dispositivo legal capitaneado com o nomen juris de “Coautoria”,
constante no §3º do art.121-A do CP, que estabelece que se comunicam ao coautor
ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do crime previstas no § 1º
deste artigo (I – violência doméstica e familiar; II – menosprezo ou
discriminação à condição de mulher).
De sua análise, verifica-se a
falta de técnica legislativa, isso porque, o termo coautoria se refere apenas à
figura das agentes que praticam a conduta típica da infração penal (pelo menos
à luz da teoria restritiva objetivo-formal, que é considerada pela doutrina majoritária como a teoria
adotada por nosso Código Penal), isto é, o verbo do tipo penal, por exemplo,
são coautores as duas pessoas que desferem golpes de faca na vítima, ocasionando
a morte desta. Todavia, o próprio §3º do art.121-A do CP diz que ele se aplica
nos casos de partícipes, ora, como se sabe, o partícipe é aquele não pratica o
verbo típico, apenas contribuindo de forma acessória para a infração penal, seja
moralmente ou materialmente. Por exemplo, é partícipe quem empresta a faca que será utilizada no homicídio.
Nesse sentido, Cleber Masson
(2021, p.432): “O art.29, caput, do Código Penal, acolheu a teoria
restritiva, no prisma objetivo-formal. Em verdade, diferencia autor e partícipe.
Aquele é quem realiza o núcleo do tipo penal; este é quem de qualquer modo concorre
para o crime, sem executar a conduta criminosa. A teoria deve, todavia, ser
complementada pela teoria da autoria mediata”.
Destarte, com relação ao §3º do
art.121-A do CP, o nomen juris correto seria concurso de agentes, termo este
que engloba tanto autores como partícipes.
Por outro lado, tem-se que o §3º
do art.121-A do CP sequer precisava ser criado, pois o art.30 do Código Penal
já trata de matéria, quando estabelece que “Não se comunicam as circunstâncias
e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”.
Além da questão penal já
comentada, cabe tecer alguns comentários sobre algumas importantes alterações
realizadas na Lei de Execução Penal e na Lei de Crimes Hediondos.
De acordo com o art.41 da LEP,
constitui direito do preso, a visita do cônjuge ou da companheira, de parentes
e amigos em dias determinados, sendo nele incluído o direito à visita intima de
seu cônjuge ou da companheira.
Antes de mais nada, cabe
registrar, que antes da Lei nº 14.994/2024, o Parágrafo único do art.41 previa
que os direitos previstos nos incisos V (proporcionalidade na distribuição do
tempo para o trabalho, o descanso e a recreação), X (visita do cônjuge, da
companheira, de parentes e amigos em dias determinados) e XV (contato com o
mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros
meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes) poderiam
ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do diretor do
estabelecimento penal, conforme sinalizei no meu livro Lei de
Execução Penal: comentários e jurisprudência (2020, p.52).
Entretanto, a Lei nº 14.994/2024
revogou o aludido Parágrafo único, criando um §1º, que estabelece que os
direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos
mediante ato motivado do juiz da execução penal. Dito de outra forma, a partir
da alteração supra, somente o juízo da execução penal poderá suspender
ou restringir os direitos previstos nos incisos V, X e XV da LEP, não tendo
mais competência para tal o diretor do estabelecimento penal.
Outrossim, a Lei nº 14.994, de
2024 incluiu um § 2º no art.41 da LEP, que dispõe que o preso condenado por
crime contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do §
1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código
Penal), não poderá usufruir do direito previsto no inciso X em relação à visita
íntima ou conjugal.
A nosso ver, o § 2º no art.41 da
LEP está relacionado com o chamado direito penal do inimigo, o qual
desconsidera que o preso tenha direitos inclusive relacionados com a dignidade
humana, devendo ser tratado como inimigo da sociedade. Ora, o contato com as
pessoas extramuros, se faz necessário para a ressocialização do preso,
inclusive a visita intima, por estar associado ao direito à liberdade sexual e
umbilicalmente ligado ao direito à saúde física e mental.
Não se pode esquecer que a
dignidade humana é fundamento de nosso Estado Democrático de Direito, conforme
inciso III do art.1º da Constituição Federal de 1988.
Ademais, o art.3º da nossa
Constituição estabelece que constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; IV
- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
Com efeito, impedir a visita
íntima é uma regra que viola a dignidade humana, pois o direito à liberdade
sexual está umbilicalmente ligado ao direito à saúde física e mental do preso.
Importa registrar, que na LEP foi
inserido o art. 146-E, que dispõe que o condenado por crime contra a mulher por
razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), ao usufruir de
qualquer benefício em que ocorra a sua saída de estabelecimento penal, será
fiscalizado por meio de monitoração eletrônica.
Com efeito, a fiscalização por monitoração
eletrônica é regra muito salutar para a proteção da mulher, contudo, resta
saber se haverá aplicação prática, sobretudo diante do fato de que em vários
estados da federação há déficit na quantidade de aparelhos disponíveis para
serem efetivamente usados.
Não menos importante, cabe
registrar que a Lei 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos) manteve a natureza
hedionda do feminicídio, agora catalogado no inciso I-B do art.1º da referida
lei.
Por fim, para poder progredir de
regime de cumprimento da pena, o preso condenado pela prática de feminicídio
deverá cumprir ao menos 55% (cinquenta e cinco por cento) da pena, se for
primário, vedado o livramento condicional, conforme inciso VI-A do art.112 da
LEP, incluído pela Lei nº 14.994, de 2024.
Ademais, de acordo com o novo §4º
do art.86, inserido pela Lei nº 14.994/2024, será transferido para
estabelecimento penal distante do local de residência da vítima, ainda que
localizado em outra unidade federativa, inclusive da União, o condenado ou
preso provisório que, tendo cometido crime de violência doméstica e familiar
contra a mulher, ameace ou pratique violência contra a vítima ou seus
familiares durante o cumprimento da pena.
Destarte, caso o condenado ou preso
provisório esteja ameaçando ou praticando violência contra a vítima ou seus
familiares durante o cumprimento da sanção penal, ele será transferido para
estabelecimento penal distante do local de residência da vítima, ainda que
localizado em outra unidade federativa, inclusive da União. Com efeito,
trata-se de regra bastante salutar, pois o cumprimento da pena mais longe do
domicílio da vítima é fator que garante mais segurança no espirito da vítima.
REFERÊNCIAS
BARROS, Franciso Dirceu; SOUZA,
Renee do Ó. Feminicídio: controvérsias e aspectos práticos. 2ª ed. Leme,
SP: Mizuno, 2021.
GOMES, Adão Mendes. Aplicação
da Pena: doutrina e jurisprudência. 1ª ed. Taboão da Serra, SP: Vicenza
Edições Acadêmicas, 2020.
GOMES, Adão Mendes. Lei de
Execução Penal: comentários e jurisprudência. 1ª ed. Taboão da Serra, SP:
Vicenza Edições Acadêmicas, 2020.
MASSON, Cleber. Direito Penal:
parte geral (arts.1º a 120). 15 ed. Rio de Janeiro: Forense; MÉTODO, 2021.
SALGADO, Amanda Bessoni Boudoux. A
Lei n° 14.994/2024 e o novo modelo brasileiro de tipificação do feminicídio. Conjur.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-out-16/a-lei-n-14-994-2024-e-o-novo-modelo-brasileiro-de-tipificacao-do-feminicidio/
. Acesso em 28.10.2024.